Passado um ano desde a declaração da pandemia de Covid-19 pela Organização Mundial da Saúde, o Supremo Tribunal Federal chega a um ano, também, da edição da primeira resolução que estabeleceu uma série de medidas para prevenção ao contágio pelo novo coronavírus na Corte. O documento instituiu em 12/3/2020, entre outros pontos, a possibilidade do trabalho remoto aos servidores maiores de 60 anos e portadores de doenças crônicas, a suspensão do atendimento presencial ao público externo que pudesse ser prestado por meio eletrônico ou telefônico, a restrição de acesso ao Tribunal, inclusive às sessões de julgamento do Plenário e Turmas, aberto apenas às partes e aos advogados de processos incluídos na pauta do dia.
Posteriormente, outras normas previram a extensão do trabalho remoto aos demais servidores e colaboradores, a ampliação dos julgamentos no sistema de Plenário Virtual, a suspensão de prazos processuais, os julgamentos por videoconferência e, na medida em que a matéria foi amplamente judicializada, a organização da pauta de modo a priorizar o julgamento de casos relacionados à Covid-19. Foram proferidas mais de 9 mil decisões e despachos em cerca de 7 mil processos relacionados à doença, evidenciando a preocupação do Tribunal com a saúde da população, a economia do país e a coordenação entre as unidades federativas no enfrentamento à pandemia.
Dentre os casos analisados, relacionados à pandemia, o STF julgou ao menos 46 pautas econômicas relevantes (ver lista ao final). Com isso, agilizou questões relacionadas à doença como forma de garantir direitos essenciais à sociedade brasileira. As decisões foram orientadas, ainda, pela necessidade de mitigar os impactos econômicos gerados pela situação de calamidade pública, como as que autorizaram a suspensão do pagamento de parcelas das dívidas dos estados e de precatórios e, ainda, as que tratam da flexibilização excepcional de regras trabalhistas.
Responsabilidade dos entes federados
Um dos casos emblemáticos foi analisado pelo STF em abril do ano passado: o Plenário, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6341, decidiu que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios têm competência concorrente para realizar ações de mitigação dos impactos da pandemia. Esse entendimento foi reafirmado em diversas ocasiões, de forma a deixar claro que é responsabilidade de todos os entes da federação adotar medidas em benefício da população para enfrentamento da pandemia.
A Corte negou pedidos de municípios que não queriam aderir a planos estaduais (STPs 442 e 449) e manteve a validade de decreto do Amazonas que proibiu o transporte fluvial de passeio (RCL 39871) e de decretos do Rio de Janeiro que flexibilizaram o isolamento social (RCL 41791).
As atribuições, a autonomia e a competência dos entes da federação também são o tema de fundo de diversas outras ações. Na ADI 6343, o Plenário decidiu, em maio, que estados e municípios, no âmbito de suas competências, podem adotar medidas de restrição à locomoção, sem a necessidade de autorização do Ministério da Saúde para a decretação de isolamento, quarentena e outras providências.
Na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 672, também foi dada competência à União para a decretar as mesmas medidas, no âmbito de suas atribuições, quando houver interesse nacional. Em outubro, foi referendada liminar para assegurar aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios liberdade para adotar medidas de combate à Covid-19, no exercício de suas atribuições e no âmbito de seus territórios.
Pautas econômicas
Em maio, o Plenário referendou medida cautelar (ADI 6357) para afastar as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei 13.898/2019) relativas à demonstração de adequação e compensação orçamentária em programas públicos destinados ao enfrentamento da Covid-19. Posteriormente, o Congresso aprovou o chamado “Orçamento de Guerra”, destinado exclusivamente a ações de combate à pandemia.
No julgamento da ADI 6362, o Supremo decidiu que todas as requisições administrativas de bens e serviços realizadas por estados, municípios e Distrito Federal para o combate ao coronavírus não dependem de prévia análise nem de autorização do Ministério da Saúde, mas devem se fundamentar em evidências científicas e serem devidamente motivadas.
Na Ação Cível Originária (ACO) 3463, o ministro Ricardo Lewandowski concedeu liminar para impedir que a União requisite insumos contratados pelo Estado de São Paulo (especialmente agulhas e seringas) para a execução do plano estadual de imunização. Segundo o ministro, a requisição administrativa não pode se voltar contra bem ou serviço de outro ente federativo, de maneira que haja indevida interferência na autonomia de um sobre outro. No mesmo sentido, o ministro Celso de Mello (aposentado) já havia impedido que a União requisitasse respiradores adquiridos pelos estados (ACOs 3385 e 3393).
Em 20 ACOs, o ministro Alexandre de Moraes determinou a suspensão do pagamento de parcelas de dívidas públicas dos estados com a União. A suspensão, em razão do momento “extraordinário e imprevisível”, foi condicionada à aplicação dos valores exclusivamente em ações relativas à pandemia e à prestação quinzenal de contas. O ministro Gilmar Mendes prorrogou por mais 180 dias o prazo de adesão de Goiás ao Regime de Recuperação Fiscal, destacando que os valores das parcelas não pagas à União deviam ser usados na saúde.
O ministro Alexandre de Moraes também determinou a destinação imediata de R$ 1,6 bilhão oriundo da Operação Lava Jato ao Ministério da Saúde, ao homologar ajuste do acordo firmado em 2019 na ADPF 568. Na mesma ação, R$ 32 milhões foram destinados ao Acre para o custeio das ações de combate ao coronavírus.
Na ACO 3359, o Plenário suspendeu os cortes no programa Bolsa Família enquanto permanecer o estado de calamidade pública decorrente da pandemia. No exame da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 56, o STF julgou prejudicado o pedido do partido Rede Sustentabilidade de declaração de mora legislativa do presidente da República e do Congresso Nacional na instituição de renda mínima temporária durante a crise socioeconômica ocasionada pela pandemia. A maioria dos ministros reconheceu o prejuízo do pedido, diante da existência de norma sobre a matéria.
Na ACO 3458, o ministro Luiz Fux, presidente do STF, autorizou a suspensão do plano de pagamentos de precatórios de 2020 determinado ao Estado de São Paulo pelo Tribunal de Justiça local (TJ-SP), mediante a comprovação da aplicação integral dos valores no custeio das ações de prevenção, contenção e enfrentamento à pandemia.
Várias decisões também foram tomadas a fim de proteger o trabalho e o emprego. Entre elas está a suspensão de dois dispositivos da Medida Provisória (MP) 927/2020, que autorizou empregadores a adotarem medidas excepcionais em razão da pandemia: o artigo 29, que não enquadra como doença ocupacional os casos de contaminação pelo coronavírus, e o artigo 31, que limitava a atuação de auditores fiscais do trabalho à atividade de orientação (ADIs 6342, 6344, 6346, 6348, 6349, 6352 e 6354).
O Plenário manteve ainda a eficácia da regra da MP 936/2020 que autoriza a redução da jornada de trabalho e do salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho por meio de acordos individuais em razão da pandemia, independentemente da anuência dos sindicatos da categoria (ADI 6363).
No julgamento da ADI 6394, o STF negou pedido do governo do Acre para afastar as limitações previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000) para as despesas com pessoal em relação aos servidores da área de saúde devido à pandemia. Também declarou inconstitucionais leis estaduais que suspenderam as cobranças, por instituições financeiras, de todos os empréstimos consignados de servidores públicos civis, militares, aposentados, inativos e pensionistas durante a calamidade pública (ADIs 6451, 6475, 6484 e 6495).
O Supremo julgou inconstitucionais leis do Ceará, do Maranhão e da Bahia que estabeleceram desconto obrigatório nas mensalidades da rede privada de ensino durante a pandemia (ADIs 6423, 6435 e 6575).
Vacinação
Em dezembro, o Plenário determinou que os estados podem estabelecer a compulsoriedade da vacinação contra a Covid-19 e impor aos cidadãos que recusarem a imunização as medidas restritivas previstas em lei, como multa, impedimento de frequentar determinados lugares ou fazer matrícula em escolas (ADIs 6586 e 6587 e ARE 1267879). A imunização à força foi proibida.
Na ADPF 770, o ministro Ricardo Lewandowski autorizou os estados, os municípios e o Distrito Federal a importar e distribuir vacinas registradas por pelo menos uma autoridade sanitária estrangeira e liberadas para distribuição comercial nos respectivos países, caso a Anvisa não observasse o prazo de 72 horas para a expedição da autorização.
Acesso à informação
Em abril, o STF suspendeu a eficácia das alterações introduzidas pela Medida Provisória 928/2020 na Lei de Acesso à Informação que, entre outros pontos, suspendiam os prazos de resposta a pedidos dirigidos a órgãos públicos durante a emergência de saúde pública. O entendimento foi de que as mudanças criaram restrições genéricas e abusivas, em ofensa aos princípios constitucionais da publicidade e da transparência nos órgãos públicos (ADIs 6351, 6347 e 6353).
Em junho, o ministro Alexandre de Moraes determinou a divulgação diária, pelo Ministério da Saúde, dos dados epidemiológicos sobre a pandemia, inclusive no site do órgão, e destacou que o status constitucional da publicidade e da transparência resulta na obrigatoriedade do Estado em fornecer as informações necessárias à sociedade (ADPF 690).
Menos assistidos
A saúde da população indígena também foi foco da atuação do STF, que compeliu o governo federal a formular um Plano de Barreiras Sanitárias para conter o contágio e a mortalidade por Covid-19 entre esses povos (ADPF 709). Entre as medidas estão ações para contenção de invasores em reservas, a criação de barreiras sanitárias para grupos em isolamento ou contato recente e o acesso de todos os indígenas ao Subsistema Indígena de Saúde.
Redação
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